a vontade tem sempre a força do instante. carregamos a ilusão no mesmo abraço. e, ainda bem, esperamos.
5.31.2008
Insónia
Invento uma insónia nova
para o corpo desabrigado.
Obrigo-me à prova
de alertar a cada trinta minutos.
Puxo o adereço que me aperta o pescoço
e, antes de sufocar, tresmalho
em relâmpagos de vida.
Na partida,
ergo-me e vagueio
quinze minutos
pelo corredor profundo,
antes de espetar a caneta no papel branco
e redigir mais um diálogo
de surdos.
Sei que elas não me compreendem.
Sonham, de quando em vez.
Se acordam,
cuidam-se prenhes de razão.
Ora, ora…
É tempo de esconder as persianas,
de encobrir as gelosias.
Tempo de inventar dúvidas.
Entre mim e eu, será um poema
a separação?
Ou um embuste?
A carga de uma perplexidade
ou um anjo de glória?
Haverá distâncias
na perplexidade que nos toca?
Ou só inventamos pertenças alheias?
O que somos:
Uma castidade de ânsias
ou uma devassidão de promessa pias?
Boa noite, cidade.
Entrego-me à cama sem
Absoluta esperança de dormir como justo.
Reconforto-me na tentativa.
Amanhã, deu lo queira,
O sol recompensará os audazes.
Saborearemos um, sempre diferente,
Brilho igual.
Boa noite, cidade.
e. u. m., Poemas Impublicáveis
para o corpo desabrigado.
Obrigo-me à prova
de alertar a cada trinta minutos.
Puxo o adereço que me aperta o pescoço
e, antes de sufocar, tresmalho
em relâmpagos de vida.
Na partida,
ergo-me e vagueio
quinze minutos
pelo corredor profundo,
antes de espetar a caneta no papel branco
e redigir mais um diálogo
de surdos.
Sei que elas não me compreendem.
Sonham, de quando em vez.
Se acordam,
cuidam-se prenhes de razão.
Ora, ora…
É tempo de esconder as persianas,
de encobrir as gelosias.
Tempo de inventar dúvidas.
Entre mim e eu, será um poema
a separação?
Ou um embuste?
A carga de uma perplexidade
ou um anjo de glória?
Haverá distâncias
na perplexidade que nos toca?
Ou só inventamos pertenças alheias?
O que somos:
Uma castidade de ânsias
ou uma devassidão de promessa pias?
Boa noite, cidade.
Entrego-me à cama sem
Absoluta esperança de dormir como justo.
Reconforto-me na tentativa.
Amanhã, deu lo queira,
O sol recompensará os audazes.
Saborearemos um, sempre diferente,
Brilho igual.
Boa noite, cidade.
e. u. m., Poemas Impublicáveis
luminosa
R m… (és) uma mistura indomável
entre a impossibilidade e o desejo.
Um impossível compromisso
entre a devassidão e a castidade.
O limite do termo nos termos
luminosos que consigamos inventar.
Deixa-te estar:
Pode ser que eu consiga soletrar
uma palavra nova.
Tão grande,
tão grande que te abarque.
entre a impossibilidade e o desejo.
Um impossível compromisso
entre a devassidão e a castidade.
O limite do termo nos termos
luminosos que consigamos inventar.
Deixa-te estar:
Pode ser que eu consiga soletrar
uma palavra nova.
Tão grande,
tão grande que te abarque.
5.25.2008
Receio
É verdade
Que me pergunto vezes a mais
Porque receio ouvir-te nos meus sonhos
Quando suo suores e solto
Ais
E da tua ausência vejo
Fantasmas medonhos
Será de gostar que tenho medo e me arrepio?
Será a tua voz mesmo suave que me enche de frio?
Anteontem fui para a cama mais cedo
Esperando que o sono viesse
E que se fosse o medo
Arriscar o receio de te pensar
E o mesmo de te perder
(eu sei que não vai dar,
que vou continuar a tremer)
Amanhã cedo o Sol talvez se finja de amigo
Teimando-me que qualquer ideia é um perigo
Não valendo de nada fugir ao pensamento
Seja de ti e da história que nós tínhamos guardada
Como se por um gesto, num escasso momento
O tempo do mundo fosse uma coisa de nada
E eu vou inventar a vida de um dia inteiro
Distraindo-me da tua imagem com coisas que nem sei
Dissimular que te esquecendo pareço porreiro
E que posso findar as coisas que comecei
Mas é tudo mentira e não sou um feiticeiro
Nem consigo explicar-me porque tanto te amei
Que me pergunto vezes a mais
Porque receio ouvir-te nos meus sonhos
Quando suo suores e solto
Ais
E da tua ausência vejo
Fantasmas medonhos
Será de gostar que tenho medo e me arrepio?
Será a tua voz mesmo suave que me enche de frio?
Anteontem fui para a cama mais cedo
Esperando que o sono viesse
E que se fosse o medo
Arriscar o receio de te pensar
E o mesmo de te perder
(eu sei que não vai dar,
que vou continuar a tremer)
Amanhã cedo o Sol talvez se finja de amigo
Teimando-me que qualquer ideia é um perigo
Não valendo de nada fugir ao pensamento
Seja de ti e da história que nós tínhamos guardada
Como se por um gesto, num escasso momento
O tempo do mundo fosse uma coisa de nada
E eu vou inventar a vida de um dia inteiro
Distraindo-me da tua imagem com coisas que nem sei
Dissimular que te esquecendo pareço porreiro
E que posso findar as coisas que comecei
Mas é tudo mentira e não sou um feiticeiro
Nem consigo explicar-me porque tanto te amei
anos
Um dia destes faço anos, se Deus queira
Ou todos os dias os faço – certa maneira.
Combino a vinte e um, a quinze ou a cinco
Depois faço, depois desfaço:
Sinto e não sinto.
Tanto faz, Mara, tanto faz: qualquer dia
se choras, teimosa, dou-te uma alegria
e nesse agrado de diluíres o tempo
tudo bem: dou-te um beijo em pensamento.
Ou todos os dias os faço – certa maneira.
Combino a vinte e um, a quinze ou a cinco
Depois faço, depois desfaço:
Sinto e não sinto.
Tanto faz, Mara, tanto faz: qualquer dia
se choras, teimosa, dou-te uma alegria
e nesse agrado de diluíres o tempo
tudo bem: dou-te um beijo em pensamento.
viagens
São verdes os olhos que vêem viagens
castanhos os que mais castos esperam:
que o maravilhoso mapa das miragens
são sonhos já sonhados que se cerram.
castanhos os que mais castos esperam:
que o maravilhoso mapa das miragens
são sonhos já sonhados que se cerram.
Perfume
Farejo o rasto do teu perfume subtil
Atrelado como um submisso dogue
Hipóteses são imensas, mais de mil
Mas esse pensa-me no que não pode
Bendita seja a mão que o misturou
Esse odor que me refaz lembrança
Este corpo de anos gasto esperou
Suspiro novo, aroma de esperança
Poderá ser ilusão tudo isso apenas
Como o são as vestes dos poemas
Mas de poder respirar o teu incenso
Deixo de sentir forças e nem penso.
Atrelado como um submisso dogue
Hipóteses são imensas, mais de mil
Mas esse pensa-me no que não pode
Bendita seja a mão que o misturou
Esse odor que me refaz lembrança
Este corpo de anos gasto esperou
Suspiro novo, aroma de esperança
Poderá ser ilusão tudo isso apenas
Como o são as vestes dos poemas
Mas de poder respirar o teu incenso
Deixo de sentir forças e nem penso.
5.24.2008
Blues fúnebres
(partindo directamente de um poema de W.H. Auden)
Parem todos os relógios e cortem o telefone
Entreguem um osso ao cão para que não sone
Silenciem os pianos e, em suave caminhar
Tragam p’ra fora o caixão e venham chorar.
Que os aviões o sobrevoem num gemido
Desenhando no céu a mensagem Falecido
O papo branco das rolas de crepes se traça
E os sinaleiros calçam luvas de desgraça
Ele era o Sul, o Leste, o Oeste e o meu Norte
A semana de trabalho e o Domingo de sorte
O meu meio-dia e a meia-noite, meu falar e cantar
Cuidava que o amor sempre durava, mas era a enganar
Não mais quero as estrelas: cada qual seja apagada
E que seja demolido o Sol e a Lua emalada
Esvaziem o oceano e o bosque por igual
Pois daqui em diante tudo virá por mal.
Parem todos os relógios e cortem o telefone
Entreguem um osso ao cão para que não sone
Silenciem os pianos e, em suave caminhar
Tragam p’ra fora o caixão e venham chorar.
Que os aviões o sobrevoem num gemido
Desenhando no céu a mensagem Falecido
O papo branco das rolas de crepes se traça
E os sinaleiros calçam luvas de desgraça
Ele era o Sul, o Leste, o Oeste e o meu Norte
A semana de trabalho e o Domingo de sorte
O meu meio-dia e a meia-noite, meu falar e cantar
Cuidava que o amor sempre durava, mas era a enganar
Não mais quero as estrelas: cada qual seja apagada
E que seja demolido o Sol e a Lua emalada
Esvaziem o oceano e o bosque por igual
Pois daqui em diante tudo virá por mal.
Coimbra B
Vogámos a Coimbra, cumprindo promessa pretérita de largar os miúdos no Portugal Deles, agora nomeado “dos pequenitos”. A empresa tardia permite-lhes, agora, que a liberdade de pronúncia coincida com a da vista. Riem de gozo ou a gozar; choram de rir, de saudade, ou de pena. A Dulcineia avançou a necessidade de complexos semelhantes clonarem a Expo, o Cultural de Belém, ou espelharem as Amoreiras. O Felisberto, meia hora depois de voar da taciturnidade, repetiu o seu refrão dos últimos dias: “Deus foi muito machista na distribuição do juízo!” Gasto o dia, quase por inteiro, avançámos a Coimbra B (uma estação pardieiro do século 20, primórdios…) onde ouvimos o sublime poema que repito: “… as carruagens da classe conforto circulam na cauda da composição”. Num enlevo, palavra a palavra. A composição, as carruagens a circular(em) e, exponencial máximo, a cauda, a cauda da composição. Cauda enorme que, todos juntos, ficámos sem saber onde tomava início.
moralidade
a moralidade tinha sido levada lá para casa. creio que fora ela quem reclamava essa obra. depois disso, tudo deixou de ser o que era.
preconceitos
escrevo palavras de cansaço. saco as ideias e elas teimam em aparecerem pegadas de preconceitos.
confundido
tinha perdido a esperança. confundira fantasmas antigos e sexo recente. nada, agora, acrescentaria serenidade à lembrança.
5.23.2008
5.22.2008
Estrelas
Vamos pintar as estrelas com azul de santo
para as distinguir no marasmo azul do céu;
Saber que saltitam na noite longa de breu.
Sim, vamos deixar algumas em branco
para mantermos um brilho mais claro
durante o sono que a noite torna ignaro
e assim continuarmos abertos ao espanto.
para as distinguir no marasmo azul do céu;
Saber que saltitam na noite longa de breu.
Sim, vamos deixar algumas em branco
para mantermos um brilho mais claro
durante o sono que a noite torna ignaro
e assim continuarmos abertos ao espanto.
eternidade
é verdade que só ele ensinava o que é eternidade. e ficou-se a saber que era importante saber disso cá na terra.
Sancho
Meu Capitão, é noite, e sonho alto
Ataca-me a lembrança do moinho.
Viro-me na enxerga em sobressalto
E não tenho das donzelas o carinho
Seria pedir muito a vós, ó Mestre
Que no sono, sem risco de apetite
Vossa bondade Dulcineia empreste
Só ao modo dum respeitoso convite
- Falas tonto e alto, Sancho, sem saberes
Esqueces os dislates que já eu te esqueci
Outro foras tu, bem mais valera morreres
Mas finjo-me surdo e que teu suor não vi
Sancho escondeu-se, parado, na amargura
De atentar assim contra a raiva do Capitão
E temeu que o sonho gritasse, a dada altura
O dulci nome que lhe atravessava o coração.
Ataca-me a lembrança do moinho.
Viro-me na enxerga em sobressalto
E não tenho das donzelas o carinho
Seria pedir muito a vós, ó Mestre
Que no sono, sem risco de apetite
Vossa bondade Dulcineia empreste
Só ao modo dum respeitoso convite
- Falas tonto e alto, Sancho, sem saberes
Esqueces os dislates que já eu te esqueci
Outro foras tu, bem mais valera morreres
Mas finjo-me surdo e que teu suor não vi
Sancho escondeu-se, parado, na amargura
De atentar assim contra a raiva do Capitão
E temeu que o sonho gritasse, a dada altura
O dulci nome que lhe atravessava o coração.
Amor morto
É hora amor, levanta a neblina
Pinto de rosa as rosas do jardim
E volto à tarde a ler a tua sina,
Que sei ter uma linha só de mim
Depois, mais adiante, o Sol irá tombar
Ambos sabemos o caminho inventado
Dividimos as frescas delícias do jantar
E vamos subir ao leito em braço dado
Não estou a sonhar, mas que mais faz
Deixa que viva por ti um dia absorto
Só no olhar, vou mostrar-te ser capaz
De refazer (em mim) o teu amor morto
Pinto de rosa as rosas do jardim
E volto à tarde a ler a tua sina,
Que sei ter uma linha só de mim
Depois, mais adiante, o Sol irá tombar
Ambos sabemos o caminho inventado
Dividimos as frescas delícias do jantar
E vamos subir ao leito em braço dado
Não estou a sonhar, mas que mais faz
Deixa que viva por ti um dia absorto
Só no olhar, vou mostrar-te ser capaz
De refazer (em mim) o teu amor morto
Mãos roubadas
Dá-me de volta as mãos que me roubaste
e que trocaste, sem cautela, num repente
como quem esgalha duma cerejeira a haste
quando disseras serem tuas para sempre.
Se as querias e não cuidas, porque insistes
que um deus teu te dá esse direito
de roubares as mãos a quem fingistes
que davas as que tens dentro do peito.
e que trocaste, sem cautela, num repente
como quem esgalha duma cerejeira a haste
quando disseras serem tuas para sempre.
Se as querias e não cuidas, porque insistes
que um deus teu te dá esse direito
de roubares as mãos a quem fingistes
que davas as que tens dentro do peito.
Capitão Quixote
Capitão de guerras inteiras por vencer
Picador de esporas em brumas de mar
Deixa-me agora erguer, cantar e gritar
Que há glória ainda no intenso perder
Moinhos gigantes, fantasmas medonhos
Virgens e donzelas sempre a conquistar;
Confundias a vista no olhar dos sonhos,
E as vitórias perdidas no acto de sonhar
Caminhos longos das feras espadas
Suores e anseios, tudo em desalinho
E além do acto, das esperas amadas
Só nos alegrava continuar o caminho.
Picador de esporas em brumas de mar
Deixa-me agora erguer, cantar e gritar
Que há glória ainda no intenso perder
Moinhos gigantes, fantasmas medonhos
Virgens e donzelas sempre a conquistar;
Confundias a vista no olhar dos sonhos,
E as vitórias perdidas no acto de sonhar
Caminhos longos das feras espadas
Suores e anseios, tudo em desalinho
E além do acto, das esperas amadas
Só nos alegrava continuar o caminho.
M.
Descia o Chiado
A passo acelerado,
Saudoso do Tejo
De repente, te vejo
Na nesga dum cotovelo
Compunhas o cabelo
De encontro à montra
E eis que – coisa tonta!
O manequim acordou
E mandou-te um beijo
Não acredito no que vejo
Mas foi! O povo parou
Olhámos-te um segundo:
M., és a melhor do mundo.
A passo acelerado,
Saudoso do Tejo
De repente, te vejo
Na nesga dum cotovelo
Compunhas o cabelo
De encontro à montra
E eis que – coisa tonta!
O manequim acordou
E mandou-te um beijo
Não acredito no que vejo
Mas foi! O povo parou
Olhámos-te um segundo:
M., és a melhor do mundo.
Com a tia, junto ao rio
O rio descia (não eu) como quem ri
E só o acompanhava aos tropeços
Na giesta maior escondia-me de ti,
Cocavas-me dava outros arremessos
Era a tarde das merendas no S. Pedro
Pão de centeio, queijo e marmelada
Depois de esbracejar água, sem medo
A sério, eu nem tinha medo de nada
Contavas então a história da princesa
Moura que enfeitiçara na Granjinha
O príncipe, e eu esquecia sobremesa
E corria novamente, encosta acima
Chegado a casa o pai pedia conta
De uma tarde inteira a fazer nada
E eu deixava os lábios em ponta
E tu fingias-te deveras preocupada
Mas claro que aprendera a aritmética
De contar os passos até saltar ao rio
E guardar a tua ideia tão profética
De aprender a ser um grande tio.
E só o acompanhava aos tropeços
Na giesta maior escondia-me de ti,
Cocavas-me dava outros arremessos
Era a tarde das merendas no S. Pedro
Pão de centeio, queijo e marmelada
Depois de esbracejar água, sem medo
A sério, eu nem tinha medo de nada
Contavas então a história da princesa
Moura que enfeitiçara na Granjinha
O príncipe, e eu esquecia sobremesa
E corria novamente, encosta acima
Chegado a casa o pai pedia conta
De uma tarde inteira a fazer nada
E eu deixava os lábios em ponta
E tu fingias-te deveras preocupada
Mas claro que aprendera a aritmética
De contar os passos até saltar ao rio
E guardar a tua ideia tão profética
De aprender a ser um grande tio.
Setembro
Em Setembro na altura das vindimas ias
À tarde recolher-te à sombra da ramada
Olhando céu, os bichos, as cestas vazias
Enquanto o bulício mexia a brisa parada
Enchias os olhos da labuta saudosa
Com que recordavas o teu ido tempo
Vendo cada gesto na forma vagarosa
Que confunde saudade e movimento
Se um catraio te reclamava uma atenção
De te ausentares da observação do outro
Arranjavas-lhe gesto de emprestar a mão
Sem que da paisagem vacilasses o gosto
E ganhavas a tarde no tempo perdido
Despreocupada com qualquer desafio
Sem pensares no teu netinho fugido
Que deveria andar a saltitar no rio
Alheio aos deveres de fingir-se capataz
A cuidar dos mostos e do vinho fino
Perdido nalgum verso que não era capaz
De prender ao gosto de continuar menino
E assim o ensinavas sem nada lhe dizer
Que o bom da vida é sentir-se a idade
Interessa é brincar, correr, crescer e ver
Que cada poema tem a sua liberdade.
À tarde recolher-te à sombra da ramada
Olhando céu, os bichos, as cestas vazias
Enquanto o bulício mexia a brisa parada
Enchias os olhos da labuta saudosa
Com que recordavas o teu ido tempo
Vendo cada gesto na forma vagarosa
Que confunde saudade e movimento
Se um catraio te reclamava uma atenção
De te ausentares da observação do outro
Arranjavas-lhe gesto de emprestar a mão
Sem que da paisagem vacilasses o gosto
E ganhavas a tarde no tempo perdido
Despreocupada com qualquer desafio
Sem pensares no teu netinho fugido
Que deveria andar a saltitar no rio
Alheio aos deveres de fingir-se capataz
A cuidar dos mostos e do vinho fino
Perdido nalgum verso que não era capaz
De prender ao gosto de continuar menino
E assim o ensinavas sem nada lhe dizer
Que o bom da vida é sentir-se a idade
Interessa é brincar, correr, crescer e ver
Que cada poema tem a sua liberdade.
Prateada
A hora deixa na noite, de arrepios
A vista de meu cansaço enevoada
Procuro no vazio dos lugares vazios
A dela, minha lembrança esvaziada.
Salpico a memória com a luz de restos
Aflijo-me de não sentir um só recordo
Invento desculpas em jeito de protestos
Como a balir, e sabendo que não mordo
Afinal o esforço não me valeria de nada
Sempre assim é a quem por pouco sofre
A mulher esconde cor em forma prateada
E anda aí a incomodar noutro (belo) blog.
A vista de meu cansaço enevoada
Procuro no vazio dos lugares vazios
A dela, minha lembrança esvaziada.
Salpico a memória com a luz de restos
Aflijo-me de não sentir um só recordo
Invento desculpas em jeito de protestos
Como a balir, e sabendo que não mordo
Afinal o esforço não me valeria de nada
Sempre assim é a quem por pouco sofre
A mulher esconde cor em forma prateada
E anda aí a incomodar noutro (belo) blog.
Queria
Queria sair
Do mundo que entijola;
Queria fugir
Desta caquéctica gaiola
Onde se escondem sabores
Gastos de esperas ocas
Gozados na ilusão d’amores
Fingidos em entregas poucas
Do mundo que entijola;
Queria fugir
Desta caquéctica gaiola
Onde se escondem sabores
Gastos de esperas ocas
Gozados na ilusão d’amores
Fingidos em entregas poucas
Bom-tom
Escoa-se entre os pequenos dedos
da memória a centelha de fogo brando
que dissipa angústias e outros medos
que sem te lembrar, de vez em quando
guardo para mim como certo castigo
de te não procurar, apenas pelo perigo
de aceitar que não é de bom-tom o risco
e vale mais parar. Então eu desisto.
da memória a centelha de fogo brando
que dissipa angústias e outros medos
que sem te lembrar, de vez em quando
guardo para mim como certo castigo
de te não procurar, apenas pelo perigo
de aceitar que não é de bom-tom o risco
e vale mais parar. Então eu desisto.
5.19.2008
domingo ido
findara um pardacento dia. dia de domingo. como se, sem nada pingar, chovesse o tempo todo.
amor livre
que liberdade de acção pode restar a um amor... é verdade que até uma pergunta, se assim feita, excede a razão.
5.18.2008
Mara
De que vale, Mara, o azul cinzento que te cobre os olhos, se não vês?
Passo ao alcance de um trejeito e confundes-me com o resto do mundo, Tanto dá…
E nem a súplica que te deixo alcança o teu perdão; nem o sorriso que desenho atinge o teu reparo. Nem nada nem ninguém me consente ousar uma espera; um ténue enlevo que fosse.
Desde há dias que não te sonho, mesmo nas noites geladas em que me recolho cedo. Levanto-me a meio da aurora sem te lembrar. E fico triste.
Ainda há meses acordava contigo numa memória de pétalas e cheiros.
Sabes que o teu aroma tem o mesmo som do olhar que me escondes?
Sabes a que cheiram os teus lábios, a que sabem os teus olhos?
O azul, se é cinzento, sabe-me igual à cor da chuva, quando cai triste em folhas de Outubro. Se o Sol te rasga, Mara, já os olhos me cheiram ao redondo dos malmequeres, num meio-dia de Maio.
O que me dói – mais de manhã, quando a falta de lembrança me não deixa esquecer-te – é não poder cantar-te o que o silêncio me revela, entoar-te um hino com a fé de um surdo, ser-te Mozart sem pintar uma nota.
Passo ao alcance de um trejeito e confundes-me com o resto do mundo, Tanto dá…
E nem a súplica que te deixo alcança o teu perdão; nem o sorriso que desenho atinge o teu reparo. Nem nada nem ninguém me consente ousar uma espera; um ténue enlevo que fosse.
Desde há dias que não te sonho, mesmo nas noites geladas em que me recolho cedo. Levanto-me a meio da aurora sem te lembrar. E fico triste.
Ainda há meses acordava contigo numa memória de pétalas e cheiros.
Sabes que o teu aroma tem o mesmo som do olhar que me escondes?
Sabes a que cheiram os teus lábios, a que sabem os teus olhos?
O azul, se é cinzento, sabe-me igual à cor da chuva, quando cai triste em folhas de Outubro. Se o Sol te rasga, Mara, já os olhos me cheiram ao redondo dos malmequeres, num meio-dia de Maio.
O que me dói – mais de manhã, quando a falta de lembrança me não deixa esquecer-te – é não poder cantar-te o que o silêncio me revela, entoar-te um hino com a fé de um surdo, ser-te Mozart sem pintar uma nota.
desentendimento
chamava ao longo do dia e o nome perdia-se nas diabruras do vento. quando a luz se perdeu ela, ela deu sinal, mas o cansaço já te tolhia o entendimento.
só no escuro
Acalenta-me a esperança fugidia
De te rever numa curva apertada
Àquela hora onde se perde o dia,
Onde a luz se mistura com o nada
Sei assim que os contornos não são teus
A mistura do que recordo e do que sonho
Esse que perde a noite nos fogos só meus
E deixa estrelas no escuro onde me ponho
Se vieres de luz, então tenho receio
De deslumbrar ao facho que me dás
De ficar preso na corrente do enleio
Que obriga o forte julgar-se incapaz
De te rever numa curva apertada
Àquela hora onde se perde o dia,
Onde a luz se mistura com o nada
Sei assim que os contornos não são teus
A mistura do que recordo e do que sonho
Esse que perde a noite nos fogos só meus
E deixa estrelas no escuro onde me ponho
Se vieres de luz, então tenho receio
De deslumbrar ao facho que me dás
De ficar preso na corrente do enleio
Que obriga o forte julgar-se incapaz
Inventando
Deixa inventar-te uma métrica nova
que barafuste dos códigos o saber
para que assim, pondo-me à prova
consiga inteirar-te o meu sofrer
em ditongos e sílabas me defino
e nas palavras, soltas aos pedaços,
as que desfaço em cada desatino
e refaço, de novo, nos abraços.
Porque falar-te vero não me dá
o jeito que cuidava e não o tenho.
Inventar outro modo? – eu sei cá…
insisto de a mais carecer engenho.
que barafuste dos códigos o saber
para que assim, pondo-me à prova
consiga inteirar-te o meu sofrer
em ditongos e sílabas me defino
e nas palavras, soltas aos pedaços,
as que desfaço em cada desatino
e refaço, de novo, nos abraços.
Porque falar-te vero não me dá
o jeito que cuidava e não o tenho.
Inventar outro modo? – eu sei cá…
insisto de a mais carecer engenho.
P D
Delgada Ponta que me dá saudade
Imagem fugidia, a par da idade
Veria essa luz na inteira noite
Sem perder este olhar d’assombro
(o mar revolto, a água, o monte)
Se pudesse sonhar-te só metade
E dormiria aconchegado no teu ombro.
Imagem fugidia, a par da idade
Veria essa luz na inteira noite
Sem perder este olhar d’assombro
(o mar revolto, a água, o monte)
Se pudesse sonhar-te só metade
E dormiria aconchegado no teu ombro.
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